NOVOS RUMOS DA AUTONOMIA
EXISTENCIAL
A
Lei 13.146/2015 instituiu o chamado “Estatuto da Pessoa com Deficiência”. A
norma foi publicada no dia 7 de julho de 2015 e entrará em vigor 180 dias após
a sua publicação.
O
Estatuto tem por escopo a proteção da pessoa com deficiência e, para isso,
dentre outras alterações no Código Civil, revogou dispositivos relacionados à
caracterização da incapacidade da pessoa física.
O
escopo da mudança se volta à tutela e à inclusão dos indivíduos com limitações
físicas e intelectuais. Mais uma lei entrará em vigor almejando a tutela de um
núcleo de vulneráveis. Ponto positivo!
Com
tal mudança, pode-se falar em alteração nos efeitos jurídicos para os atos da
vida civil atribuídos às pessoas com determinada limitação física ou
intelectual?
É
sabido que nem toda deficiência afeta a capacidade plena da pessoa para os
exercícios dos atos da vida civil (casamento, constituição de relações
familiares, trabalho, negócios, etc.). Dessa maneira, a falta de discernimento
e a impossibilidade de manifestação plena da vontade são condições para a
limitação do exercício dos atos jurídicos e, quando comprovados, entra a
necessidade da implementação dos poderes de representação.
A
alteração legislativa, no que se refere aos artigos 3o e 4o
do Código Civil, pode ser assim apresentada:
Código Civil de 2002 (antes da Lei 13.146
de 2015)
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Código Civil de 2002 (após a vigência da
Lei 13.146 de 2015
|
Art. 3o
São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida
civil:
I - os
menores de dezesseis anos;
II - os
que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário
discernimento para a prática desses atos;
III -
os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.
Art. 4o
São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:
I - os
maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os
ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental,
tenham o discernimento reduzido;
III -
os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;
IV - os
pródigos.
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Art. 3o
São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de
dezesseis anos.
Art. 4o
São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer os maiores de
dezesseis e menores de dezoito anos.
|
O
Código Civil, antes da Lei nº 13.146 de 2015, adotava quanto ao sistema de
incapacidade um critério incoerente ao alocar a pessoa como incapaz,
absolutamente ou relativamente, necessitando de terceiros como intermediários
para o exercício de atos ligados a interesses econômicos, deixando, todavia, em
aberto a tutela dos interesses existenciais do indivíduo (relacionamento,
casamento, personalidade, dentre outros).
Com
a revogação dos incisos acima indicados, o legislador, pelo que parece, teve
como propósito atribuir à pessoa com limitações a sua proteção integral, em
todos os aspectos (físicos, psíquicos, econômicos, éticos e sociais), por ser
igualmente um sujeito de direito que pode ter uma função socialmente ativa, sendo que a incapacidade será efetivada em cada caso e não mais tratada
genericamente quando se constatar determinada limitação do indivíduo e a partir
de critérios taxativos indicados na lei.
O
exercício da autonomia existencial do indivíduo ganha força. Ponto positivo! A
falta de clareza, no entanto, quanto à questão de representação, em casos de
conflitos, irá depender de uma interpretação casuística e contará com o
subjetivismo do julgador. Ponto negativo!
Ganha-se,
e muito, com a valorização à autonomia existencial da pessoa humana. A ideia de
titularidade de direitos e deveres se volta agora para um cenário unificado de
tutela (patrimonial e existencial) para toda pessoa humana. O cerne da questão
é dar ênfase à existência e à personalidade, tutelando os atributos elementares do
ser humano e o livre desenvolvimento da sua vida, numa linha de reflexão, como aquela proposta por Hannah Arendt, na qual o respeito
pela dignidade do ser passa pelo reconhecimento de cada indivíduo humano como
edificador de mundos ou coedificador de um mundo comum.
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