Quem sou eu

Doutora e Mestre do programa de pós-graduação stricto sensu em Direitos e Garantias Fundamentais da Faculdade de Direito de Vitória (FDV). Especialista em Direito Empresarial (FDV). Professora de Direito Civil da graduação e pós-graduação lato sensu da FDV. Sócia fundadora do escritório Lyra Duque Advogados (www.lyraduque.com.br).

CONTRATO DE COMODATO: morte do comodante

Abaixo apresento respostas às dúvidas suscitadas por um leitor do blog sobre o contrato de comodato.
PERGUNTA DO LEITOR: "(...) A partir do momento que o comodante falece o comodato perde a validade? (...) Os herdeiros devem cumprir esse contrato? Nesse caso, a maioridade é de 18 ou 21 anos?" (Editado).
MINHAS RESPOSTAS:
1. Em caso de morte do comodatário, normalmente, o contrato se encerra, pois é celebrado em caráter personalíssimo. No entanto, se morrer o comodante entende-se que seus herdeiros podem exigir a devolução do bem, porque o contrato é um negócio gratuito.
2. De acordo com o artigo 3º do Código Civil, “a menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil”.
Os autores Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald (2011, p. 864) entendem que a morte do comodante não determina a extinção do contrato, que pode prosseguir com os sucessores do falecido. Por outro lado, a morte do comodatário poderá ou não extinguir o contrato, a depender do seu caráter personalíssimo. 

ATRASO NA ENTREGA DE APARTAMENTO

Segue abaixo um típico caso de inadimplemento do contrato de compra e venda por culpa da alienante, em razão do atraso da entrega da unidade imobiliária. Ponto interessante da decisão abaixo foi a utilização, ainda que implícita, da teoria da inadimplemento antecipado do contrato ("não é justo que as partes-autoras continuem a adimplir as suas obrigações contratuais da forma originariamente ajustada").
Segundo decisão do TJ-RN, uma construtora terá que "pagar, mensalmente, o valor de R$750,00 a dois clientes que compraram apartamento da construtora e ainda não receberam o imóvel. Além dessa quantia, referente a 0,5% do valor de mercado do aluguel de um imóvel similar ao que contratado, a empresa deverá pagar também o valor correspondente à multa contratual prevista na Cláusula Sétima, Parágrafo Segundo do contrato, até a efetiva entrega do imóvel. O juiz da 11ª Vara Cível de Natal, Geomar Brito Medeiros, arbitrou ainda multa de mil reais para cada evento que venha significar descumprimento da decisão, limitado ao valor dado à causa (R$20 mil)".
Os compradores celebraram, desde 12/07/2008, um "Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda de imóvel, que tem por objeto prometido a aquisição um apartamento. O prazo de entrega do empreendimento foi estipulado  originalmente para 30/10/2010, mas o cronograma original não foi cumprido e não os clientes não sabem se quer a data efetiva da entrega do imóvel".
"De acordo com o magistrado, embora o próprio Código Civil/2002, em seu art. 393, trate das "isenções/excludentes de responsabilidade", isso diante de fatos tipificados como "caso fortuito" ou "força maior", frutos de situações "imprevisíveis e/ou inevitáveis", tais infortúnios, também constam na Cláusula Sétima, Parágrafo Primeiro do contrato, não ocorreram e, mesmo que tivessem ocorrido, a mora contratual se arrasta, na linha do tempo, por prazo muito superior ao que previsto legal e contratualmente".
O juiz Geomar Brito entendeu que "não é justo que as partes-autoras continuem a adimplir as suas obrigações contratuais da forma originariamente ajustada, quando, doutro lado, a parte-ré não vem cumprindo o que lhe toca, obstaculando que as partes-autoras pudessem gozar do bem prometido dentro do prazo contratado. Assim, nada mais razoável do que remunerar as partes-autoras com o valor do aluguel que estão deixando de auferir acaso o seu imóvel estivesse pronto, sob sua posse e alugado”.
"Apesar de entender pelo pagamento referente ao aluguel, o juiz ponderou quanto ao valor pedido pelas partes. Segundo o magistrado, foi tomado como parâmetro o valor do aluguel de um imóvel que atualmente as partes ocupam no bairro de Petrópolis".
“Dessa forma, somos de concluir que o valor do aluguel mensal pretendido pelos autores (R$1.500,00) não é adequado para o caso em estudo. Ora, é notório que os imóveis de médio valor, conforme a cotação do mercado natalense, não alcançam aluguéis que correspondam a 1% do seu valor venal. Em sendo assim, tomando por parâmetro o valor venal aproximado do imóvel (R$150 mil), isso tomando-se por base o valor comercial do metro quadrado (R$3.000,00), bem como a área construída do apartamento (56m²), entendemos, em sede de cognição sumária, ser razoável que o valor do aluguel a ser pago pela Método às partes-autoras seja correspondente a 0,5% do valor venal de mercado do imóvel adquirido por elas, ou seja, R$750,00”, determinou o juiz. (TJ-RN. Processo n.º 0108114-81.2012.8.20.0001). (grifo nosso).
Disponível em: http://www.tjrn.jus.br:8080/sitetj/GerenciadorServlet.do?secaoSelecionada_id=9&id=8748&action=GerenciadorWeb&operacao=exibirInternet&exibir=E&registrarLeitura=true.

DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - SOLIDARIEDADE PASSIVA


Quando o credor demanda apenas contra um dos devedores solidários significa dizer que ele está renunciando a solidariedade em relação aos demais? Acreditamos que não! O Código Civil, no artigo 275, parágrafo único, é claro nesse sentido ao dispor que:

Art. 275. O credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto.
Parágrafo único. Não importará renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor contra um ou alguns dos devedores.
A decisão abaixo apresenta uma situação de permanência do direito do credor em executar um devedor que não tinha o seu nome na petição, em fase de cumprimento da sentença, bem como em razão de um acordo celebrado entre os devedores na relação interna.
"CONDENAÇÃO. SOLIDARIEDADE. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. PERSISTÊNCIA DA RELAÇÃO PROCESSUAL. PETIÇÃO. FASE EXPROPRIATÓRIA. EXCLUSÃO DE UM DOS DEVEDORES. FACULDADE DO CREDOR. EXCEÇÃO. CONTRAPOSIÇÃO DIRETA À PRETENSÃO. Tendo os réus, devidamente citados, sido condenados de forma solidária pelo provimento final da fase cognitiva, estão todos eles automaticamente sujeitos à atividade expropriatória realizada na fase do cumprimento da sentença. A possibilidade de exclusão do devedor solidário é faculdade do credor que assim optar expressamente, não se confundindo a simples ausência do nome de algum dos condenados na petição que requer o início da fase do cumprimento da sentença, com a renuncia da solidariedade. Exceção de direito material é aquela que se contrapõe de forma direta à obrigação na qual se funda a pretensão autoral. Por isso, o acordo celebrado entre devedores solidários, sem qualquer participação do credor, e sem qualquer relação com a obrigação cujo adimplemento são responsáveis, não pode ser oposto como forma de exonerar um dos sujeitos passivos do vínculo obrigacional". (TJ-MG. AGRAVO N° 1.0024.02.825479-5/001. BELO HORIZONTE. RELATORA: SELMA MARQUES). (grifo nosso).

CONTRATO DE FINANCIAMENTO: morte do vendedor

"A 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) determinou que os compradores de um imóvel, cujo contrato foi firmado com a Caixa Econômica Federal (CEF) pelo proprietário anterior, têm direito à escritura definitiva do imóvel com a morte do titular do financiamento. 
Os compradores, um casal, contam que adquiriram um imóvel através de um contrato particular de compra e venda, em dezembro de 1989, e que ficou combinado entre as partes que o financiamento obtido junto à CEF iria permanecer em nome do vendedor (antigo proprietário) até o pagamento da última parcela, configurando o conhecido “contrato de gaveta”. O casal afirma que após 17 anos da concretização da compra “foram surpreendidos com a recusa da CEF em receber as prestações, quando souberam que o vendedor havia morrido”. 
O casal ainda conta que ao procurar a inventariante, viúva do vendedor, ela lhes informou que havia notificado a CEF sobre a morte do marido “mas que não iria informar sobre a venda do imóvel e muito menos cumprir com a obrigação assumida sem antes receber algo em troca”. 
Além da transferência definitiva do imóvel, o casal solicitou na Justiça a devolução das parcelas pagas à CEF após morte do vendedor já que, em conjunto com as prestações, pagaram todos os prêmios do seguro por morte ou invalidez, “que na ocasião do falecimento do titular do contrato veio a cobrir o saldo devedor”. 
A inventariante alega que a transferência definitiva do imóvel se subordinaria ao pagamento da entrada e do saldo devedor e não à morte do vendedor. Sendo que, segundo ela, a quitação do saldo devedor pela morte é benefício personalíssimo familiar que não se transfere a terceiros. 
O juiz da 5ª Vara Cível da comarca de Belo Horizonte, Antônio Belasque Filho, exigiu que a inventariante do espólio do vendedor do imóvel outorgue a escritura pública do imóvel em favor dos compradores, mas não determinou a devolução das parcelas pagas à CEF após a morte do antigo proprietário. 
As partes recorreram da decisão, mas o desembargador Wanderley Paiva confirmou integralmente a sentença. Ele explica que “diante do pagamento pelo adquirente de todas as prestações do financiamento e do seguro habitacional até o falecimento do vendedor, deve-se aproveitar o seguro em favor dos autores diante da sub-rogação ocorrida”. 
O desembargador também explica que os compradores não indicaram de forma segura que houve devolução de dinheiro pela CEF aos herdeiros. Com estes argumentos determinou a transferência do imóvel para os compradores. 
Os desembargadores Selma Marques e Fernando Caldeira Brant concordaram com o relator". 
Disponível em: http://www.tjmg.jus.br/anexos/nt/noticia.jsp?codigoNoticia=41518.

ALUGUEL DE VAGAS DE GARAGEM

O condomínio pode interferir na vontade do proprietário que pretende alugar a sua vaga de garagem para terceiro? A convenção do condomínio pode afrontar o livre exercício do direito de propriedade do condômino? Com a mudança no artigo 1.331, parágrafo primeiro, do Código Civil brasileiro, essas questões precisam ser respondidas.
O artigo 1.331 do Código Civil apresentava a segunda redação:
Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos.
§ 1o As partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas, sobrelojas ou abrigos para veículos, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários". (grifo nosso).
 A Lei 12.607 de 2012 alterou o referido parágrafo que passou a ter a seguinte redação:
"§ 1o  As partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas e sobrelojas, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários, exceto os abrigos para veículos, que não poderão ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo autorização expressa na convenção de condomínio". (grifo nosso).
Entendemos que a vaga de garagem é um bem acessório e, portanto, vinculado à unidade imobiliária. Nesse caso, os dois bens são exclusivos do proprietário. Compreendemos que o objetivo da alteração no Código Civil foi oferecer mais segurança ao condôminos ao tentar impedir que terceiros, pessoas estranhas ao condomínio, transitem no prédio. É louvável tal medida, porém ela afeta sim o direito de propriedade do condômino.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12607.htm.

BEM DE FAMÍLIA

Sabe-se que o bem de família é impenhorável. No entanto, o artigo 3º da Lei 8.009 de 1990 dispõe sobre algumas exceções sobre tal impenhorabilidade. 
Uma exceção prevista no inciso V, do referido artigo, dispõe que:
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar; (grifo nosso).
Cabe, contudo, analisar qual dívida poderá atingir o bem de família. Nesse caso, a interpretação da norma deve ser limitada à dívida contraída para favorecer a própria família e que não tenha envolvimento algum com terceiros. Nesse sentido, segue entendimento do STJ.

"IMPENHORABILIDADE. BEM DE FAMÍLIA. A exceção prevista no art. 3º, V, da Lei n. 8.009/1991, que deve ser interpretada restritivamente, somente atinge os bens que foram dados em garantia de dívidas contraídas em benefício da própria família. No caso, a hipoteca foi constituída em garantia de dívida de terceiro, o que não afasta a proteção dada ao imóvel pela lei que rege os bens de família. Precedentes citados:REsp 268.690-SP, DJ 12/3/2001; REsp 1.022.735-RS, DJe 18/2/2010, e AgRg no AgRg no Ag 1.094.203-SP, DJe 10/5/2011".(STJ. REsp 997.261-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/3/2012).

CONTRATO DE SEGURO SAÚDE: rede conveniada

A rede conveniada é fator relevante no contrato de seguro saúde. Toda e qualquer alteração sobre os profissionais credenciados ao contrato de seguro deverá ser comunicada individualmente a cada segurado. Segue decisão do STJ sobre o tema.
"CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. REDE CONVENIADA. ALTERAÇÃO. INFORMAÇÃO. Tendo em vista a importância que a rede conveniada assume para a continuidade do contrato, a operadora de plano de saúde somente cumprirá o dever de informar se comunicar individualmente a cada associado o descredenciamento de médicos e hospitais. Isso porque o direito à informação visa assegurar ao consumidor uma escolha consciente, permitindo que suas expectativas em relação ao produto ou serviço sejam de fato atingidas, manifestando o que vem sendo denominado de consentimento informado ou vontade qualificada. Diante disso, o comando do art. 6º, III, do CDC somente será efetivamente cumprido quando a informação for prestada ao consumidor de forma adequada, assim entendida como aquela que se apresenta simultaneamente completagratuita e útil, vedada, no último caso, a diluição da comunicação efetivamente relevante pelo uso de informações soltas, redundantes ou destituídas de qualquer serventia para o consumidor".  (STJ. REsp 1.144.840-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/3/2012).

CADASTRO DE INADIMPLENTES

Pode uma lei estadual impedir a inscrição de consumidores inadimplentes no serviço de proteção ao crédito? Entendemos que não pode, pois, primeiramente, a matéria é de competência da União. Em segundo plano, a Lei Federal 8.078 de 1990 (Código de Proteção de Defesa do Consumidor) já regula a temática e autoriza tal prática. Assim, há nítida inconstitucionalidade pelas razões expostas.
Concordamos com as alegações da Associação, especialmente, quanto às fundamentações pautadas na igualdade e no desequilíbrio econômico que tal lei estadual irá ensejar nas práticas contratuais entre prestadores de serviço de telefonia e consumidores, já que poderá incentivar o descumprimento do contrato pelos consumidores.
Segue a notícia sobre o tema divulgada no site do Supremo.
"A Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (Telcomp) ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4740) contra lei sul-mato-grossense que proíbe a inscrição de consumidores nos cadastros de restrição ao crédito por falta de pagamento das contas de consumo oriundas da prestação de serviço público no âmbito do Estado do Mato Grosso do Sul.
Na ação, a Telcomp sustenta que a Lei 3.749/2009, do Estado de Mato Grosso do Sul, invadiu competência privativa da União para legislar sobre o tema. Alega que a Constituição Federal (artigos 21, 22, 174 e 175) estabelece que compete privativamente à União tratar de serviços de telecomunicações.
Para tanto, já existe a Lei 9.472/97, de âmbito federal, além de outras normas expedidas pelo órgão regulador – Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) – “único ente competente para impor obrigações decorrentes dos contratos de concessão firmados com as empresas de telecomunicações”, segundo a Telcomp.
Além disso, a associação sustenta que, ao impedir a inscrição de inadimplentes nos cadastros de proteção ao crédito, a lei estadual desequilibrou o sistema referente à relação jurídica entre as empresas de telecomunicações e usuários. Para a Telcomp, a inscrição de consumidores como inadimplentes “serve justamente para manter o equilíbrio do sistema em todo o território nacional, pois é notório que esse procedimento coíbe ou desencoraja o inadimplemento”. (grifo nosso)
Sustenta ainda que a norma sul-mato-grossense criou um fator discriminatório entre os usuários de serviços de telecomunicações do Mato Grosso do Sul e os dos demais estados da federação, e que não existe nada que justifique o tratamento diferenciado a tal classe de consumidores em detrimento das demais.
“A mencionada norma estadual acabou por criar uma zona de conforto para os inadimplentes, já que poderão deixar de cumprir contrato firmado com a empresa de telecomunicações, sem que o mercado, de modo geral, saiba que aquela pessoa é inadimplente e configura fator de risco para as concessões de crédito”, afirma.
Por essas razões, pede liminar para suspender a íntegra da lei e, no mérito, que seja declarada inconstitucional. O relator da ADI é o ministro Ricardo Lewandowski".