Nos meses de dezembro e janeiro a situação se repete no Estado do Espírito Santo: chuvas intensas, ruas alagadas, cidadãos desabrigados e o Poder Público permanece inerte, além de ficar omisso, durante os meses sem chuvas, quanto às ações preventivas que poderiam ser tomadas antecipadamente.
É claro que, em eventos climáticos, aparecem questões previsíveis e imprevisíveis, como é o caso da intensidade das chuvas em grau não antes imaginável, o que gera tragédias sem igual.
Por outro lado, quando os acontecimentos são habituais, sempre ocorrem com a mesma frequência e em intensidades já esperadas, sem a devida ação do Estado que permita evitar as tragédias, o ordenamento jurídico brasileiro prevê a responsabilidade do Poder Público pelos danos causados à população e, assim, cabe falar em indenização aos prejudicados.
A fundamentação jurídica para tal responsabilização reside no artigo 37, §6, da Constituição da República, a saber: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.
Contudo, os Tribunais, nesses casos, divergem quanto à espécie de responsabilidade a ser aplicada frente à omissão do Estado. Uma posição defende que a vítima deverá comprovar a culpa do Estado e todos os prejuízos suportados, vez que tal situação se relaciona com a chamada responsabilização civil subjetiva, ou seja, o dever de provar a culpa do Estado será do próprio cidadão.
Em linha contrária, a outra posição defende que, ainda que se verifique a omissão do Estado, deve ser aplicada a responsabilidade objetiva, isto é, o prejudicado precisa apenas demonstrar a ocorrência do dano e o nexo de causalidade entre o prejuízo suportado e a atuação do Estado.
Entendemos que essa temática objetiva é a mais razoável, diante de tantos danos reiteradamente suportados pelos cidadãos por problemas previsíveis provocados pelas chuvas, isso porque os entes públicos têm o dever de exercer a sua atividade administrativa com absoluta segurança.
Seguem abaixo alguns julgados que tratam do tema responsabilidade civil do Estado por omissão.
CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. LEGITIMIDADE PASSIVA DO DISTRITO FEDERAL. QUEDA DE ÁRVORE EM LOGRADOURO PÚBLICO. AVARIA EM VEÍCULO DO AUTOR. RESPONSABILIDADE PELA PODA E RETIRADA DE ÁRVORES. OMISSÃO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO ESTADO. FAUTE DU SERVICE. DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À HONRA, INTIMIDADE E VIDA PRIVADA DO AUTOR. MERO ABORRECIMENTO. 1 - Nada obstante a NOVACAP seja a empresa pública responsável pelos serviços de urbanização, incluindo poda e retirada de árvores dos logradouros públicos, há responsabilidade subsidiária do Ente Público pela fiscalização e manutenção das áreas públicas. 2 - Restando demonstrado que os prepostos dos réus se omitiram no dever de poda, retirada e conservação da arborização em logradouro público, que deu ensejo à queda de uma árvore sobre o veículo do autor, exsurge a responsabilidade subjetiva do Estado de reparar o dano sofrido, eis que presentes o nexo de causalidade e o dano. 3 - Configurando o fato lesivo mero aborrecimento e não gerando violação à intimidade, à imagem ou à vida privada do autor, não há falar em indenização a título de danos morais. 4 - Recurso da NOVACAP provido parcialmente. Recurso do Distrito Federal não provido. Recurso do autor não provido. (TJ-DF. 20070110310636APC, Relator CRUZ MACEDO, 4ª Turma Cível, julgado em 15/12/2010, DJ 11/01/2011 p. 356).
APELAÇÃO CÍVEL - ADMINSTRATIVO - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO ESTADO - DANO POR ACIDENTE EM VIA PÚBLICA - DECLIVES NA PISTA - OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO NÃO-CARACTERIZADA 1. A responsabilidade estatal, por omissão (faute du service) é subjetiva, sendo necessária, além da demonstração do dano e do nexo de causalidade, a caracterização da conduta omissiva da administração que resultou no ilícito civil. 2. O rebaixamento no piso de uma das faixas de rolagem, na época de chuvas, não é suficiente para demonstrar que a Administração foi negligente, deixando de realizar a manutenção devida na via pública. 3. Negou-se provimento ao apelo do autor. (TJ-DF. 20070110450993APC, Relator SÉRGIO ROCHA, 2ª Turma Cível, julgado em 01/09/2010, DJ 05/10/2010 p. 86)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. OMISSÃO. DEVER DE FISCALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO. ART. 37, § 6º, CF/88. NEXO CAUSAL. FATOS E PROVAS. SÚMULA STF 279. 1. Existência de nexo causal entre a omissão do Município e o dano causado ao agravado. Precedente. 2. Incidência da Súmula STF 279 para afastar a alegada ofensa ao artigo 37, § 6º, da Constituição Federal - responsabilidade objetiva do Estado. 3. Agravo regimental improvido. (STF. AI 742555 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 24/08/2010, DJe-168 DIVULG 09-09-2010 PUBLIC 10-09-2010 EMENT VOL-02414-06 PP-01169)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO ESTADO. OMISSÃO. FALTA DE CONSERVAÇÃO DE VIA PÚBLICA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. QUEDA EM BUEIRO ABERTO. ART. 37, § 6º, CF/88. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. 1. Em sede de recurso extraordinário não é permitido inovar com argumentos não abordados pelo acórdão recorrido. Ausência do necessário prequestionamento (Súmula STF 282). 2. Incidência da Súmula STF 279 para alterar conclusão do Tribunal de origem, que se limitou a aferir a responsabilidade subjetiva do município por ato omissivo específico, nos termos da teoria do faute du service. 3. Agravo regimental improvido. (STF. AI 727483 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 19/10/2010, DJe-222 DIVULG 18-11-2010 PUBLIC 19-11-2010 EMENT VOL-02434-03 PP-00458)
Por fim, registra-se, no entanto, que se o evento for imprevisível, assim qualificado na lei como caso fortuito, ou for um evento pautado na força maior, como aquele acontecimento que não se pode evitar, o Estado não responderá pelos danos suportados pelas vítimas.
Quanto à indenização, as vítimas podem exigir o pagamento daquilo que efetivamente perdeu com os desmoronamentos, alagamentos, destruição das casas, perdas totais dos móveis e objetos pessoais, bem como o ressarcimento para cobrir o custo da construção de um outro imóvel igual ao destruído.
Se ocorrer a morte, em decorrência das tragédias provocadas pelas chuvas, os familiares dependentes da pessoa falecida podem pedir indenização sob a forma de pensão, além do reembolso pelos gastos com o funeral, com o hospital, transporte, etc.
Por fim, não se pode afastar, ainda, a possibilidade do pleito de dano moral a fim de reparar todo o abalo psicológico que o acontecimento provocou às vítimas.